quarta-feira, 5 de agosto de 2009

O Vaso*

Em sua pequena casa, haviam vasos de flores espalhados pela sala, cozinha, e tinha o privilégio de poder contar com uma humilde varanda, seu espaço predileto, para onde suas pernas o levavam espontaneamente, junto de outras flores e de sua planta preferida: um pé de morango.

Há pouco, havia comprado um vaso para receber mais uma companheira e o posto na varanda, ao lado de seu querido morangueiro. Era preciso conseguir tempo, tempo para morangos, flores e vasos vazios.

Dias depois, passando pela feira no caminho de seu trabalho, reparou numa senhora que naquela manhã ocupava um pequeno espaço entre as barracas, expondo uma única flor sobre um pano branco estendido no chão.

"Bom dia, senhora. Sua flor é muito bonita. Estranho nunca ter visto a senhora vendendo flores por aqui."

"Estou sempre de passagem, meu filho. Vez ou outra, quando nasce uma flor no meu quintal, trago ela para enfeitar a vista das pessoas."

Infelizmente, ele não poderia levar consigo a vistosa flor da senhora. Quem sabe mais tarde, quando estivesse a caminho de casa. Lamentou-se, explicou à mulher e partiu, vendo em seu rosto um terno e inquietante sorriso.

Saiu afoito do trabalho em direção à feira, ansioso por encontrar o pano branco estendido no chão, mas a senhora não estava mais lá - havia levado sua flor embora, ou entregue a um estranho.

Chegando em casa, suas pernas o levaram espontaneamente à varanda, para aproveitar os últimos raios de luz do dia junto de seu morangueiro. Sentou-se no chão, um pouco inquieto, e encostou suas costas e cabeça na parede, olhando para o vaso vazio na sua frente. Fechou os olhos, ternamente, respirou fundo e deixou escapar o ar.

.

2 comentários:

  1. Cara, gostei, mas não sei dizer porque motivo.
    O clima de cumplicidade com o morangueiro é singelo e comovente (pra falar a verdade foi essa relação que mais me atraiu!). Você tem algo a dizer sobre esse texto? tem algo a ver com aproveitar as oportunidades, inclusive de cuidar do próprio morangueiro e não se omitir em seus cuidados? Viajei. Hehehehe

    Abs

    ResponderExcluir
  2. Morango do Nordeste*22 de agosto de 2009 às 09:17

    Fred grafiteiro! Há quanto tempo! Toda semana visito seu blog pra ver se tem um novo post, mas sei como é, inspiração, tempo e palavras nem sempre convergem tão frequentemente como gostaríamos.

    Pôxa, incrível, mesmo não sabendo o motivo você acertou em cheio! Hehe. Realmente, pode-se dizer que o principal argumento do texto é o de como podemos aproveitar, ou aceitar, as oportunidades que aparecem em nossass vida, e como elas surgem, de maneira tão casual, breve/ passageira, levando consigo o lânguido ruminar das experiências que não foram efetivadas. Tem também a relação com o morangueiro, em particular (minha fruta e planta preferida, pois carrego um sinal de nascência, ou melhor, um moranguinho de nascência, rs - sem contar a referência a uma de minhas músicas preferidas "Strawberry Fields"), e as flores em geral, que abarcam uma quantidade enorme de metáforas, sobretudo a da beleza: não poder cultivar as flores que nascem/ surgem em seu caminho é não poder experimentar (o vaso, ter a companhia d-) a beleza que elas podem trazer a sua vida, deixando assim, nossos vasos de belezas e vivências, vazios, pelo menos até que se preencha.

    Quando estava tendo as ideias de imagens para o texto, gostei de brincar com a sonoridade e o significado de "vaso vazio". E tentei também pintar os espaços da casa (tão importantes pra mim), os momentos que passamos sozinhos neles - tudo com uma tonalidade de fim de tarde.


    Abraaaço!

    ResponderExcluir