quinta-feira, 14 de maio de 2009

Vésperas de São João*

Eram vésperas de São João e o menino não tinha um chapéu de palha. Sua blusinha xadrez, a calça enfeitada de remendos, o lencinho - não bastavam -; sem o chapéu ele não queria dançar a quadrilha da escola.
Sua mãe procurou em tudo quanto foi canto da cidade, mas não encontrou o bendito chapéu. O menino ficou triste, ressentido mesmo, e é dificil ver uma criança assim, calada, desanimada, perdida em uma vontade inocente que nem ela mesma sabe o tamanho.
Então a mãe disse para que ele tivesse paciência e sugeriu que ele fizesse uma promessa para ajudar a conseguir o que ele queria. Prometeu, mais querendo e chorando do que acreditando, e teve que esperar.
E conseguiu! Um pouco antes da festa, um amiguinho que já tinha usado emprestou o chapéu dele e o menino foi satisfeito dançar a quadrilha, com o chapeú de palha, o bigodinho pintado, a blusinha xadrez, o lencinho, a calça enfeitada de remendos e a namoradinha seu par. Até hoje tem as fotos.
E depois cumpriu a promessa: enfrentou a timidez, ficou de pé na frente de todo mundo que ia na igreja, agradaceu o seu desejo que tinha sido realizado e contou para as pessoas como era bom acreditar, ter paciência e saber esperar.
Até hoje o menino lembra, até hoje ele tenta se lembrar...


6 comentários:

  1. Bité,

    Mais um lindo texto. Com sabor de infância e de lembranças que se perdem no tempo, mas saem de nossos corações. É interessante que muitas vezes eu questione as doses de melancolia presentes em alguns de seus textos, mas, sempre que leio textos que me remetem a tempos passados, sinto uma certa "melancolia nostálgica" invadir meu coração...

    Creio que as Festas Juninas e Quadrilhas povoam o imaginário de muitas crianças. O único risco de isso cessar é a Festa Junina ser substituída pela "Country", como podemos ver em muitos lugares. Sintomas da aculturação e dos efeitos negativos da globalização.

    Mas gostei também da reflexão religiosa (ao menos para mim) que este texto suscita. Cada vez mais me percebo analisando quase tudo sob esta ótica. Isso pode ser bom ou ruim, depende de quem julga. A Consciência de Krishna alega que Krishna realiza nossos desejos na medida do nosso merecimento. Fico feliz que seu desejo tenha sido realizado e que este tenha se transformado em um belo texto de uma linda lembrança da infância.

    Um abraço.

    P.S. - Por favor, não adquira o hábito de comentar o que escrevemos.

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  2. Errata

    Onde eu disse "saem de nossos corações", entenda-se "que nunca saem de nossos corações".

    Abração.

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  3. Outra Errata

    No "P.S." quando escrevo "não adquira o hábito de comentar o que escrevemos", eu quero dizer "não adquira o hábito de NÃO comentar o que escrevemos.

    Outro abraço.

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  4. Poxa... acho que eu também já fiquei sem dançar porque não tinha o meu chapéu.

    Também já fiquei sem beijar porque a menina achava que eu era pequeno demais pra ela. Muitos anos depois, passei por ela de carro quando estava esperando o ônibus no ponto. Dei a volta no quarteirão e parei em frente na frente dela. Perguntei se não queria carona... ela olhou desconfiada mas entrou. Quando trocamos algumas palavras sobre para onde ia, ela disse: "você não é aquele menininho... o Jânio... você era tão magrinho e pequeno..."

    Aí eu disse: “sou eu mesmo... da escola... um dia você não quis me beijar... e hoje você está tão mais bonita..."

    Ela sorriu e me disse dissimulada: "nunca é tarde demais para esperar..."

    Grande Abraço!

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  5. Não perdendo o hábito de comentar - e aproveitando para alguma metalinguagem -, vamos lá: como notam os comentários, este é mais um texto-produto da memória/lembrança. Como já disse, acho importante esse processo; tento resgatar os destroços que sobrevivem às forças implacáveis do tempo, na tentativa de lembrar que as coisas realmente existiram. Enfim. No entanto, no final o texto é trazido para o presente, indicando justamente esse esforço de "tentar lembrar". Acho que esse processo também está bem simbolizado com as "fotografias" que o menino guarda, e que textualmente são paralelas a esse esforço para lembrar ("Até hoje...").
    Confesso que a presença da igreja do texto foi uma opção feita para ser o mais fiel possível a essas memórias, tentando não as alterar com minha ideologia atual - profana, eu diria -, e mantendo assim o foco nos sentimentos do menino, bem como nos valores que este aprende (acreditar, ter paciência, saber esperar). Por isso também, tentei ser o mais simples possível na construção das passagens, usando uma linguagem bem coloquial, que uma criança talvez usaria, sem maiores extravagâncias estilísticas e imagéticas; "em tudo quanto foi quanto", "bendito chapéu", são expressões que, por exemplo, consigo ouvir minha mãe falando, e fazem parte também do meu linguajar ordinário.

    Bom, espero que tenha contribuído.
    Eu, particularmente, sou apaixonado po metalinguagem e faço esse tipo de comentários com o maior prazer, hehehe.

    Pensei em deixar para publicar esse texto mais próximo do mês de junho, mas quando consigo parir a idéia fico ansioso pra escrever, rs. Maio é véspera o suficiente.

    É isso.


    Valew!!!

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  6. OS ANOS PASSAM , MAS LEMBRANÇAS FICAM!!
    MUITO BOM LEMBRAR DO MEU MENINO, ESPERTO
    E ATIVO, A PACIÊNCIA , É UMA VIRTUDE,
    E CONFIANÇA É SABER ESPERAR!!!

    BEIJOS FILHINHO AMADO
    MAINHA SUA.

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