(Repost 16.05.08)
Dizem os especialistas em linguagem
que o homem não seria possível sem que se comunicasse e significasse através da
magnífica e simples complexidade de uma língua; o que permite atribuir ao
esplêndido homus erectus a nobre qualidade de humano, este capaz de alcançar
elevadíssimos sentimentos e realizar importantíssimos empreendimentos.
Uma das características que tornam
possíveis tais singulares e fabulosos feitos, segundo os especialistas, é a
maneira como a linguagem se estrutura, valendo-se de duas articulações fundamentais:
a de distinguir uma partícula sonora de outras, como um "p" de um
"b", por exemplo, e agregá-las a outras de forma a constituir um significado,
"pobre"; e uma segunda que articula a diversidade de significações
possíveis a formas restritas, como o infinitivo de um verbo "-ar",
que ao mesmo tempo pode ser o "ar", da palavra que respiramos.
Pois eu estaria discordando dessa
incrível e supostamente única qualidade, que distingue o homem do animal, o
qual tem sua linguagem limitada a pouquíssimos elementos, como "alimento,
cópula, localização"; uma abelhinha não pode com seus zunidos dizer a seu
parceiro que o ama, ou que as flores daquela tarde de primavera a fizeram
lembrar do sabor de um mel colhido há tempos atrás – triste condição de inseto,
pensarão os de bom coração – como não poder amar e lembrar?
Mas, afinal, o que tem o homem de
tão diverso, necessário e sublime para significar? Por mais que me esforce para
ouvir, expressar, conhecer, não consigo encontrar mais do que um vasto – sem
dúvida –, mas numerável repertório de palavras e modos de falar para uma meia
dúzia de conceitos que vão sendo atualizados e contextualizados ao longo do
tempo e do espaço. Tenho mesmo a audácia de dizer – mas não sem algum respaldo
de preguiçosamente ter tido contato com algumas reflexões, modernas ou
antiquíssimas, do oriente ao ocidente, sobre o que e como é ser esse ente
formidável, humano –, que toda discussão mais profunda, e o sentimento mais
visceral, podem ser reduzidos, sintetizados, em alguns poucos e grandes
conceitos, orientados de acordo com algum ponto de vista: amor-vontade-desejo,
morte-impermanência-religião, et coetera...
Por isso acho tão encantadora a
conversa das cabras que pastam no terreno atrás de onde moro. Não estarão elas
a dizer e considerar as mesmas coisas que nós? Em linguagem de cabra, devem
estar a questionar: "Paixão é novidade antiga?", no que eu consinto:
"É..."; "Ali tem mais capim", "É...";
"Aquele bode com um chifre só, esquerdo, é o diabo",
"É..."; "A Grande Cabra há de nos guiar e salvar!",
"É..."; "Ó, como amo, para todo o sempre, a mais bela e alva das
cabritas!", "É..."
Muito provavelmente é também devido
a toda essa cabritagem que acabo de especular que costumo pouco me espantar com
a variedade do gênero dos homens, vindos das mais distantes e inusitadas
culturas do globo, que vêm me contar seus causos e histórias, assuntos
urgentes, de sujeitos satisfeitos e possuidores de uma alma que os tornam todos
muito especiais.
"É..."
Nenhum comentário:
Postar um comentário